segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Resíduos agrícolas viram autopeças e telas de TV


Resíduos de algodão podem ser transformados em nanocristais de celulose para fabricação de telas de celulares e de televisão. Os do sisal têm espaço na indústria de peças automotivas, em substituição ao plástico, ou na construção civil, para reforçar o concreto. Do coco, pode-se fabricar o painel lignocelulósico, um compensado ecológico para fabricação de móveis, divisórias e painéis de isolamento acústico. Tudo isso a partir do que não é aproveitado pelas cadeias produtivas. 
A equipe da Embrapa trabalha com um sistema semelhante ao das refinarias de petróleo, chamado biorrefinaria. Os pesquisadores utilizam a biomassa, composta por materiais como celulose, colágeno, lignina, pectina, taninos, amido, ácidos graxos, quitosana, corantes naturais, para obter produtos como energia, materiais e produtos químicos.

"Alguns desses materiais podem ser utilizados para síntese de produtos concorrentes aos derivados de petróleo, como poliéster, polietileno etc., com a vantagem de serem biodegradáveis", explica o pesquisador da Embrapa Algodão (PB) João Paulo Saraiva, que também integra o grupo.
Para apoiar essas ações, foi criado o Laboratório de Tecnologia da Biomassa, em Fortaleza (CE), em um empenho para descobrir fins mais nobres para resíduos derivados de culturas como algodão, coco, sisal, dendê, cana-de-açúcar, além da agroindústria de frutas.
Um exemplo: pesquisadores da Embrapa estudaram uma rota química capaz de transformar o línter num insumo nanotecnológico, para emprego em indústrias de alta tecnologia. O línter são as fibras curtas de algodão que permanecem em volta da semente após o desfibramento e normalmente não são usadas na fiação, tornando-se um resíduo agroindustrial. 
Reduzir o volume de resíduos agropecuários e aumentar o valor agregado de subprodutos da agricultura é o objetivo de diversas pesquisas da Embrapa. "O desenvolvimento e a implementação de processos sustentáveis capazes de converter biomassa em produtos com valor agregado é uma necessidade absoluta para aproveitar resíduos agroindustriais e gerar menor impacto ambiental", defende a pesquisadora da Embrapa Agroindústria Tropical, Morsyleide de Freitas. 
Línter de algodão: fibra curta de grande potencial
Atualmente, o línter é utilizado como fonte de fibras para reforço de resinas sintéticas, na produção de papéis técnicos e especiais, de algodão cirúrgico, e como fonte de celulose. Mas, transformado em nanocristais de celulose, ganha novos usos: "Esses cristais podem ser utilizados como um aditivo no acabamento de peças têxteis, em telas de celulares e televisão, ou no preparo de filmes biodegradáveis ou ainda como estabilizantes de emulsões, dentre diversas outras funções", enumera o pesquisador  João Paulo Saraiva,  da Embrapa Algodão.
A nanocelulose já vem sendo produzida em países como Japão, Canadá, Suécia, Finlândia, Estados Unidos e começam a surgir pequenas empresas em Israel e na China. Nesses países, a principal matéria-prima usada é madeira, por sua abundância. O línter já é muito usado como celulose de alta pureza, para uso na indústria química, farmacêutica e industrial.
No entanto, um dos problemas desse processo é que a tecnologia encarece em cerca de dez vezes o valor do subproduto. Ou seja, um grama de nanocelulose seria dez vezes mais cara que um grama de microcelulose, por exemplo, que custa entre R$ 40 e R$ 50, o quilo. Saraiva explica que "o grande desafio nas pesquisas, hoje, é aumentar a escala de produção e baratear o custo, para que mais empresas possam usá-lo como insumo, em substituição a compostos derivados do petróleo.

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