Os
pescadores profissionais artesanais e suas pororocas
A
pororoca é um fenômeno da foz do Rio Amazonas que se manifesta no encontro do mar
com o rio e que ganhou importância pela forma como invade, empurra, altera o
som do ambiente e a paisagem anterior, construindo outra. Os pescadores profissionais
artesanais familiares têm tomado atitudes que os destaca e chama atenção tal
qual a pororoca. Em 1915,
acontece a revolta dos pescadores em Recife, Pernambuco, contra os foros
extorsivos cobrados pelos donos de mangues e viveiros de pesca. Talvez seja
esta a primeira greve do Brasil, porque os pescadores se recusaram a despescar,
o que, numa cidade em que guardavam as sextas-feiras e se vivia do produto dos
rios, a “revolta” chamou a atenção das próprias autoridades coloniais. (O Ano Vermelho,
Expressão Popular, Alberto L. Bandeira, 2004). Em 1911, o Capitão de Corveta
Frederico Villar viaja a Inglaterra,EUA,Japão,Russia,Escandinávia,Dinamarca,Alemanha,Bélgica,França,Itália
e conhece a organização dos pescadores, que se monstrará útil aos governos
durante a primeira guerra mundial, que começou três anos depois, em 1914. Em 13.10.19,
o Cruzador Bonifácio sai do porto do Rio de Janeiro rumo a Belém, Pará, tendo como
uma de suas Missões, a fundação de colônias de pescadores. Em 10.08.20 é
fundada, no Rio de Janeiro, a Confederação Geral dos Pescadores do Brasil
vinculada a Diretoria de Portos e Costas do Ministério da Marinha. Em 10.08.23,
a pesca é vinculada ao Ministério de Negócios da Marinha, que aprova os Estatutos
da Confederação Geral dos Pescadores do Brasil e da Confederação das Colônias
de Pescadores dos Estados. Encerra-se nesse ano, a Missão do Cruzador
Bonifácio, com a criação de cerca de 800 colônias de pescadores. Como contra
partida, elas ficam com o controle exclusivo da representação dos pescadores
artesanais e dos trabalhadores da pesca no país. Nenhuma outra forma
organizativa de representação – associação ou sindicato de pescadores – seria
reconhecida pelo poder público federal. Aos pescadores insatisfeitos e
inconformados restaram atitudes de coragem e desprendimento. Foi o que fizeram muitos
jangadeiros em viagens homéricas. A aposentadoria dos pescadores foi conseguida
em uma dessas viagens, pelos jangadeiros cearenses José Erenilson Severiano da
Silva e José Maria da Silva, o Zé Surrão, em 1972, ao serem recebidos pelo
Presidente Emílio Médici, em Brasília. (Aventura dos Jangadeiros do Nordeste,
R.Caruso,PANAM,2004).
Estas
e outras informações vieram á tona por ocasião da Constituinte da Pesca, 1987-88,
pelos pescadores profissionais artesanais familiares, querendo entender a razão
de não se sentirem representados pelo sistema único de colônias. Tentaram se
colocar a serviço do país não mais como uma espécie de exército de reserva da
Marinha do Brasil mas como produtores rurais que sempre foram. Os constituintes
preferiram manter a situação do jeito que estava. Aprovaram um parágrafo único
no Artigo 8° da CF/88, regulamentado quase 20 anos depois, pela Lei 11.699/08,
que mantém o imbróglio até hoje, 25 anos depois.
A
nova Lei da Pesca, 19.959/09, equiparou a condição do pescador profissional
artesanal familiar ao agricultor familiar. No entanto, a sua representação junto
aos órgãos do governo federal, continua bloqueada. O sistema único cresceu e se
expandiu também com apoio do governo federal, através do serviço de extensão
rural. Sabe-se que é composto pela Confederação Nacional, 27 Federações Estaduais
e 1.200 colônias. Para garantir-se este sistema se movimenta de várias formas,
ora acionando a justiça comum, ora a justiça federal, ora pressionando o poder
legislativo, ora o executivo.
Contrariando a
constituição de 1988
A
pergunta que não quer calar é: como é possível se manter um sistema
representativo único de profissionais da pesca, contrariando a Constituição
Federal de 1988? Quais as consequências
desta situação? O atraso do setor pesqueiro artesanal e comercial. Pouco tem
adiantado criar planos, projetos, estratégias, metodologias, construir e ceder infraestruturas,
facilitar o acesso ao crédito, aos mercados e a criação de órgãos federais
específicos, como SUDEPE e MPA. Nada disso importa a este sistema.
Dia
15 de março, aconteceu nova manifestação da pororoca dos pescadores, no Auditório
do DNIT, em Brasília, na AP - Audiência Pública - convocada pelo MTE para
“discutir o registro de colônias de pescadores, Federações Estaduais e
Confederação Nacional dos Pescadores, no âmbito do MTE e os pontos de
equiparação entre as mesmas e os sindicatos, para efeito de registro junto ao
MTE”. O destaque, no entanto, acabou sendo a exoneração do Ministro nesse mesmo
dia.
O
sistema único prefere confiar na sua força política. Conseguiu a realização de duas
AP`s: a primeira em 9.6.09, na Comissão da Amazônia, presidida pelo Dep. Fed.
Silas Câmara(AM); a segunda dia 14.03.13, na Comissão da Agricultura e Reforma
Agrária do Senado, presidida pelo senador Benedito de Lira (AL).
A
AP do MTE serviu para a confirmação de que a pororoca dos pescadores está
ecoando no AM,AC,RR,MA,PI,CE,PE,SE,BA,ES,RJ,SP,PR, SC e RS.
Agora
é acompanhar o que será feito com suas recomendações.
Estevam Ferreira
da Costa
Extensionista
militante
Coordenador do
MOPAM
efc1955@gmail.com
Parabéns Estevam,
ResponderExcluirO texto retrata bem a situação dos pescadores Brasileiros - desamparados pelo governo e vulneráveis a uma falsa gestão associativa com estas pseudo organizações que pouco representam os interesses dos pescadores.
Saudações.