quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Governo tem postura dúbia em relação aos conflitos fundiários entre índios e produtores, diz cientista política

           
Canal Rural
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Nos últimos dias, várias reuniões foram feitas em Brasília para resolver o conflito entre indígenas e produtores
A cientista política da Universidade de São Paulo (USP) Jacqueline Quaresemin, em análise sobre a atual situação de disputa de terras entre índios e produtores rurais no país, afirmou que a posição do governo diante da situação é dúbia, o que só agrava os confrontos.

– O governo tenta mediar o conflito. Quando produtores procuram, ele tem uma posição, quando índios procuram, tem outra. O governo teria que, imediatamente, pedir uma trégua e, nesse meio tempo, construir uma alternativa real e viável – destacou em entrevista ao programa Bom Dia Campo, do Canal Rural, na manhã desta quinta, dia 28.

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Ela aponta que, se as terras são consideradas indígenas, o governo precisa desapropriar as áreas, mas sem desconsiderar as famílias que produzem e ocupam o local. Para ela, neste momento, a questão não deve ser avaliada no Judiciário, pois é social e política.

– Não adianta garantir terra para os índios. Você tem que avançar nas políticas, qualificá-los. Ocorre que não podemos ter índios como algo sacralizado. Porque se eles forem excluídos, ficarão vulneráveis nesses conflitos – disse Jacqueline. Ela sinalizou que um ato deve reunir diversas comunidades indígenas, em setembro, na capital federal, e que o governo deveria tomar uma atitude até lá.

O deputado federal Valdir Colatto (PMDB-SC) concorda que a questão não é somente agrária:

– É importante dar aos indígenas oportunidades de inclusão social. Eles reclamam que a Funai [Fundação Nacional do Índio] não lhes oferece educação, assistência médica. (...) Eles precisam de uma política indigenista própria, para índios brasileiros.

Para Colatto, um dos principais problemas desses conflitos é a perda do direito à propriedade.

– Ninguém é contra o indígena. Mas a questão fundiária, a questão do direito à propriedade,  parece que não existe mais. E essa é uma prerrogativa que o Congresso está puxando para si, tentando trazer uma legislação clara e definida para dizer o que é ou não terra indígena no país. (...) O direito de propriedade não está sendo reconhecido mesmo com escritura pública, feito pelos Estados, pela União. O governo disse que reconheceria esses títulos e não está reconhecendo.

Ele explica que o Congresso Nacional se responsabilizou em "clarear a legislação", especialmente o artigo 231, o qual a Funai e outros órgãos alegam não estar bem definido. Segundo o parlamentar, o artigo refere que as terras indígenas são aquelas tradicionalmente ocupadas quando foi promulgada a Constituição, em 5 de outubro de 1988. 

– Se criou um impasse de que terras tradicionais são aquelas que voltam a 1500 (ano) ou aquelas que realmente são ocupadas. O Supremo Tribunal Federal, quando julgou o caso Raposa Serra do Sol, disse que o marco temporal é de 5 de outubro de 1988 – destacou.

Para resolver a questão agrária, o deputado acredita que o governo deveria comprar terras e destiná-as às comunidades indígenas, já que não dispõe de verbas para indenizar milhões de produtores solicitantes:

– O governo não pode chegar para pessoas que têm propriedades com cem anos de escritura, já comandadas pela terceira geração, e simplesmente desapropriar as terras. O governo precisa garantir a segurança dos proprietários. Tem que indenizá-los, mas não há dinheiro para indenizar todas as áreas. O governo tem que comprar terras e dar para os índios.

Segundo ele, há muitos problemas políticos relacionados às terras indígenas oficiais. Ele cita casos em que produtores arrendam áreas dos índios, que são consideradas de preservação. Colatto ainda mencionou o caso da terra Raposa Serra do Sol, que "já não está mais habitada por índios".
De acordo com o deputado, 13% do território brasileiro é indígena, e o governo pretende ampliar esse território para 25%. Segundo ele, a Funai indica que 819 mil indígenas habitam o Brasil, sendo que metade se encontra na cidade. Atualmente, 611 áreas estão em análise demarcatória.

Conflitos em destaque
O atual conflito indígena em destaque no país acontece na Bahia. A Força Nacional de Segurança continua em Buerarema, no sul do Estado. O processo de demarcação da terra indígena começou em 2004. Cinco anos depois, a Funai aprovou o relatório que destinou 47 mil hectares de área para os indígenas, mas o Ministério da Justiça não assinou a portaria declaratória. De acordo com a Associação de Pequenos Agricultores de Ilhéus, Una e Buerarema, todos os dias, novas propriedades são invadidas e produtores, ameaçados. Nesta semana, o presidente da associação fez um apelo à presidente Dilma Rousseff, reforçando o prejuízo que a demarcação traz para a região e para o Brasil.

No Rio Grande do Sul, o governo estadual apresentou uma proposta oficial para resolver os conflito entre índios e produtores. Para os municípios de Vicente Dutra, Caçapava do Sul, Soledade e Viamão, a ideia é de que os proprietários sejam indenizados e reassentados. Hoje, cerca de 60 áreas estão em disputa no Estado.

Nos últimos dias, várias reuniões foram feitas em Brasília para resolver os conflitos indígenas, principalmente os que ocorrem em Mato Grosso do Sul. No último encontro entre produtores e o Ministério da Justiça, realizado na terça, dia 27, não houve definição. A reunião tinha o objetivo de definir a compra de propriedades destinadas à ampliação ou criação de novas áreas indígenas no Estado. Os conflitos no Centro-Oeste se tornaram mais intensos neste ano depois da morte de um indígena durante uma desocupação de terra em Buriti.

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